Crítica | Don’t Forget Me


★★★★☆
4/5

Desde seu salto súbito para a fama com o sucesso de sua música “Alaska” no ano de 2016, Maggie Rogers percorreu um longo caminho. De lá pra cá, ela lançou dois álbuns de estúdio e em 2022 se matriculou em um mestrado sobre religião e vida pública na Harvard Divinity School, em busca de respostas para como lidar melhor com sua fama. Gravado em um período de cinco dias, conjuntamente com Ian Fitchuk, multi-instrumentista e produtor, Don’t Forget Me, seu terceiro álbum de estúdio, evoca a liberdade que vem com o amadurecimento e a árdua tarefa de dar adeus às coisas.

Em carta publicada em seu perfil do Instagram, a cantora e compositora revela que gostaria que seu novo álbum soasse como uma tarde ensolarada, como um passeio no seu carro favorito: “[...] Eu queria fazer um álbum para cantar alto sozinho no seu carro, queria que o álbum fosse como um amigo confiável no banco do passageiro, pronto para estar lá quando você precisasse dele.”

Rogers acerta em sua aposta, pois descreve a real sensação que temos ao nos aventurarmos por seu mais novo trabalho. Se antes a cantora possuía ambições comerciais e artísticas, como ela mesma comenta em entrevista ao The New Yorker, nesse momento suas ambições se concentram em seu lado pessoal. Ela está apenas tentando se divertir e ter um bom momento enquanto está aqui.

O álbum conta com elementos que moldaram seu trabalho anterior, Surrender — acordes acústicos com influências do americana e elementos de produção característicos dos anos 90. Mas os aspectos que a caracterizavam vem com ainda mais força em seu novo registro de inéditas, juntamente a uma sonoridade que flerta levemente com o country pop, influência provavelmente provinda de Ian Fitcuhuk, que trabalhou com Kacey Musgraves em seu último álbum lançado, Deeper Well, assim como em Golden Hour.

Se por um lado seu primeiro álbum foi acusado de ser “excessivamente produzido”, em Don’t Forget Me Rogers parece rejeitar rebuscamentos, com uma aproximação mais clara e direta ao que almeja dizer. Nada é desperdiçado, as coisas são ditas como são e esse é um dos méritos do álbum.

Em “It Was Coming All Alone”, faixa que abre o disco, ela canta sobre observar a vida ao seu redor mudar conforme o tempo passa e o quão assustador isso pode ser: “Call my mother on the phone / Said there's talking in the kitchen / Of selling my childhood home / And everywhere I look around / It seems we're always saying goodbye”.

“So Sick of Dreaming” é um dos destaques do disco, em que Rogers canta sobre alguém que foi incapaz de colocá-la em primeiro lugar. A faixa conta com intervenções de áudio onde ela detalha como a pessoa a trocou por um jogo de basquete: “So he calls me up 15 minutes before the reservation / And says he’s got Knicks tickets instead / I mean, I was at the restaurant!”. “And by the way, the Knicks lost” ela conclui, em tom de ironia.

Talvez seja um equívoco interpretar todas as faixas como pessoais, Rogers comentou em entrevistas recentes que se deixou brincar um pouco com o folclore por trás do gênero folk, entretanto, alerta que não tentemos adivinhar o que é pessoal e o que não é. Assim, nos é permitido uma maior liberdade enquanto ouvintes, pois podemos criar um mundo com as palavras e cenários que ela nos apresenta.

“I Still Do” é uma balada delicada em meio a sonoridade que permeia o disco. Acompanhada por um piano, ela canta: “‘Cause love is not a debt you pay / It's not something you can give away / Love is not the final straw / But it's always a reason to risk it all”, expressando a ideia de que, apesar de estar “cansada de sonhar”, o amor um dia vivido ainda ecoa através de suas músicas e é razão o suficiente para se arriscar mais uma vez. Ela ainda se permite sonhar e amar, mesmo que o amor não seja o fim de tudo.

“Don’t Forget Me”, canção homônima ao álbum e que Rogers define como sua favorita de todas que já escreveu, fecha o disco com perfeição. Nela, a cantora se estende sobre como está em um momento da vida diferente de seus amigos que estão todos se casando e pede por um parceiro imaginário que a trate bem: “So close the door and change the channel / Give me something I can handle / A good lover or someone that's nice to me”. No verso seguinte ela pede que esse futuro parceiro a ame até seu próximo alguém, mas que quando esse momento chegar, que ele não a esqueça: “Take my money, wreck my Sundays / Love me ‘til your next somebody / Oh, but promise me that whеn it's time to leave / Don’t forgеt me”.

A faixa final é a culminação de tudo que o álbum nos apresenta desde o início: a percepção de que a vida é complexa e difícil, que as coisas que mais amamos podem e vão nos deixar algum dia, mas que isso não significa que essas mesmas coisas precisam ser esquecidas. É o reconhecimento de que tudo que amamos nos marca de alguma forma e que podemos honrar isso através da memória, trazendo um pouco de cada pessoa e lugar que nos atravessa através do simples viver.

Don’t Forget Me é um álbum sólido, coeso, mas que não deixa de trazer um lado divertido, provocativo e ainda pouco visto de Maggie Rogers. Nele, ela soa madura e como uma velha amiga que também está em busca de respostas mas que, pela primeira vez, sabe que não as ter é um tremendo alívio.

Selo: Capitol
Formato: LP
Gênero: Folk / Pop Rock, Folk Pop
Mateus Carneiro

Graduando em Letras pela UTFPR. Nutro um interesse pela exploração de diversas formas de expressão artística, incluindo a música, o cinema e outras manifestações culturais. Faço parte das curadorias de folk, eletrônica e experimental no Aquele Tuim.

Postagem Anterior Próxima Postagem