Crítica | Bradock, Vol.1


★★★★☆
4/5

O funk vem sendo trabalhado, nos últimos anos, de maneira extensiva, em que cada vez mais o gênero se mescla com outras sonoridades, rompendo as limitações de uma “caixinha” estilística. Mas é comum que, na tentativa de inovar, o trabalho acabe caindo em escolhas clichês ou maneiristas, ou se utilize de técnicas que outrora seriam vistas como inovação, mas que o uso massivo as tornou previsíveis.

Em meio a esse cenário, DJ JEJEDAZS nos agracia com um trabalho que respira criatividade e autenticidade, recheado de um funk explosivo: o DJ conduz o ouvinte a uma experiência de vinte minutos eufóricos, sem descanso. Utilizando-se de todos os artifícios disponíveis, ele constroi um trabalho detalhista ao extremo — sons e beats se equalizam e se deformam ao longo das faixas de maneira surreal, como se cada transição fosse um choque calculado entre o caos e o controle, um detalhismo que desmonta o ritmo para remontá-lo em colagens imprevisíveis.

Mas falar da ousadia do artista exige ir além do caos aparente. As faixas se unem a elementos estéticos que não apenas não temem o caos, mas o abraçam como dogma. "Sequência de Rock do Magrinho" é a prova crua: a repetição obsessiva e o beat desestabilizante não pedem licença — sua única preocupação, enquanto ouve, será sobreviver a um turbilhão de sons. E então, na metade da música, a explosão com risadas distorcidas que irrompem como sirenes, colidindo com baixos estourados em um clímax que é puro vandalismo sonoro. Ele não "une" elementos cacofônicos; incendeia-os e dança sobre os escombros, transformando ruído em narrativa.

"Bolhas Relaxantes" é o experimento que desafia qualquer rótulo. O beat inicial — um click que lembra passos de games retrô — é só isca. Em segundos, surge o baixo: não um ritmo, mas um arrasto granulado, como se as notas fossem triturar o chão. Os chiados não são acidentes; são calculados perfeitamente— sons que parecem não ter sentido, mas a suas construções ao longo da música mostra que isso não é verdade. E no ápice da pressão, entra "Relexa a Bct Mulher": a amostra é intacta, quase uma tentativa de demonstrar que o som vai desacelerar. As vozes fluem como se nada estivesse errado, enquanto o instrumental desaba em colunas de ruído. Ele não quer relaxar você; quer que engula a desordem e descubra beleza nela. Aqui, o DJ prova que domina a regra mais rara: sujar o som sem perder a precisão. Cada interferência tem lugar, cada grunhido eletrônico é passo calculado. Não é música fácil — é a melhor do álbum porque sua complexidade é de outro mundo.

O álbum explora bastante sonoridades que abrangem o eletrônico numa perspectiva que se descola da máxima de que o gênero se reproduz também no funk, o que, no conjunto da obra, é uma escolha inteligente e bem executada. No entanto, certos caminhos desse uso acabam resvalando em familiaridades. “Automotivo pras Planetárias” traz ideias promissoras, como o contraste entre as vozes – uma mais natural, outra grave e intensa. Ainda assim, a repetição pode soar monótona em alguns momentos. “Beat Alucinação Celestial” quase segue pelo mesmo caminho, mas a riqueza de elementos mantém a faixa dinâmica. No geral, ambas não comprometem o álbum; pelo contrário, podem ser encaradas como pausas estratégicas entre os momentos mais intensos.

Bradock, Vol. 1 em qualquer película em que você veja esse trabalho, o resultado será o mesmo — um trabalho em que o funk se revitaliza por meio de uma criatividade exuberante e que, mesmo sendo o começo do ano, já se mostra um destaque.

Selo: Independente
Formato: LP
Gênero: Funk / Funk Mandelão

Antonio Rivers

Me chamo Antonio Rivers, graduando em História, amazonense nascido em 2006. Faço parte do Aquele Tuim, nas curadorias de Experimental, Eletrônica, R&B e Soul.

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