Entrevista | DJ Ramon Sucesso


Uma entrevista com o DJ e produtor sobre sua ascensão no funk, a recepção de seu LP Sexta dos Crias e um pouco dos seus planos para o futuro.

Natural do Rio de Janeiro, DJ Ramon Sucesso é um dos mais prestigiados produtores de funk carioca dos últimos anos. Seu trabalho de destaque, o LP Sexta dos Crias, ficou conhecido mundialmente após a revista Pitchfork publicar uma crítica positiva elogiando as características únicas do produtor.

A obra, da qual se orgulha por popularizar o chamado Beat Bolha, apareceu em diversas listas de melhores discos do ano de 2023, inclusive nas nossas. DJ Ramon Sucesso é um jovem de futuro brilhante e, por mais reconhecido que seja, mantém a humildade como princípio inviolável de seu fazer artístico — algo muito evidente nos vídeos virais chamados de sexta dos crias, nos quais ele reproduz suas produções altamente distorcidas em posts que viajam pelo mundo.

Para saber mais detalhes sobre essa ascensão em sua carreira, mesmo fazendo parte de seu público e o acompanhando há muito tempo, batemos um papo descontraído com o produtor, que nos revelou detalhes inéditos. Leia:

Felipe: Antes de começar, gostaria de dar parabéns porque o Flamengo ganhou o campeonato estadual de ontem!

DJ Ramon Sucesso: Valeu Valeu, Obrigado! (hahaha)

Felipe: Gostaria de começar a entrevista pedindo para que você se apresentasse, falasse quem é o DJ Ramon Sucesso e principalmente o que é o sucesso no seu nome artístico, o que ele significa?

DJ Ramon Sucesso: (hahahaha) É uma história, tá ligado? Esse sucesso no nome é porque eu comecei como youtuber com meu irmão e a gente tinha vários canais, e alguns amigos nossos tinham o nome “Sucessada”, entendeu? Aí botamos o nome de Irmãos Sucessada no primeiro canal que a gente criou, meu irmão desistiu e eu continuei. Aí eu falei assim: “Pô, agora tenho que fazer um nome só pra mim”, e então tirei Sucessada e coloquei Sucesso.

Felipe: Como DJ de funk é fácil perceber a troca constante de ideias, sons, técnicas de produção que é feita com outros milhares de DJs do país, é assim que o funk se desenvolve e permanece vivo. Porém, gostaríamos de perguntar sobre uma referência no seu trabalho que foge dessas trocas frequentes com seus contemporâneos, algo que te inspira, de uma maneira ou de outra, a produzir funk, mas que poucos imaginariam que pudesse ser uma influência.

DJ Ramon Sucesso: Então... quando eu comecei a minha referência maior é quem hoje é amigo meu, o DJ DENILSON CHAPADÃO, DJ ULISSES COUTINHO, mas hoje em dia a referência sou eu mesmo, entendeu? Eu me espelhei em mim mesmo. Eu procuro fazer as coisas diferentes que ninguém faz.

Felipe: E justamente por essa referência principal ser tu, né? E quando você busca por sons para destruir com suas distorções e manipulações frenéticas, o que normalmente você procura? Algo inesperado, uma voz marcante, uma entonação forte, o que se destaca mais entre os clipes que você usa?

DJ Ramon Sucesso: Ah, tipo assim, às vezes eu produzo e faço a faixa na intenção de como vou gravar o vídeo e sempre procuro fazer uma parada diferente nos vídeos, né? Fazer uma parada diferenciada pra não ficar a mesma coisa pros outros não enjoar também. É mais isso.

Felipe: Quando tu posta os vídeos toda sexta-feira é sagrado, praticamente o tema de sexta dos crias nas suas redes e tal, como você reage com as brincadeiras? O que o pessoal fala que tu está distorcendo o espaço e tempo, que tu tá quebrando a camada e tudo mais, o que tu acha desses comentários?

DJ Ramon Sucesso: Pô, tipo assim, tem muitos comentários que meio que eu já me acostumei, mas tem uns que cada sexta é diferente, aí é engraçado, eu fico rindo também e tem muitos comentários que acho normal.

Felipe: Tem um aqui, eu posso ler? que eu acabei de ver no teu vídeo mais recente e que achei mais engraçado; é assim: "os demônios extradimensionais só não invadem nossa realidade mortal pois a Sexta dos Crias destrói e reconstrói o nosso tecido existencial a cada vibração e distorção do DJ, e por isso os espíritos malignos ficam com medo” 

DJ Ramon Sucesso: (hahahahahahaha) Tem um que eu vi esses dias que eu ri muito, é: "Eu e minha casa serviremos a Ramon Sucesso" (hahahaha).

Felipe: (ri) Toda vez que tu posta eu sempre vou atrás só pra ver o que o pessoal fala. E agora percorrendo por algum dos seus trabalhos, notamos um certo interesse seu pelo trap, por exemplo. Além do funk, com beat bolha e esse seu estilo bem definido, você pretende explorar algo mais voltado para outro estilo?

DJ Ramon Sucesso: Tipo… até faço sim um trap ali, mas não é meu forte, nem gosto de postar, entendeu? A minha pegada é mais o funk, eu não acho legal pular de cabeça no trap, ta ligado? Largar onde eu comecei, entendeu?

Felipe: É mais uma inspiração mesmo, que tu gosta e tal, mas nada comparado ao funk?

DJ Ramon Sucesso: Sim, porque no meu dia a dia eu não sou muito de ficar escutando funk, fico escutando mais trap, entendeu?

Felipe: Enquanto você crescia, durante sua infância, adolescência e até os tempos atuais, tem algum familiar que te inspirou a seguir o caminho da música? Ou alguém próximo que te fez começar a correr atrás de produzir arte ou consumi-la mais minuciosamente?

DJ Ramon Sucesso: Não... na minha família não tem nenhum músico. Eu tive a iniciativa de querer isso pra mim e minha família me apoiar, tipo pra mim não desistir, pra mim continuar fazendo as paradas, os vídeos, até mesmo meu irmão me ajudando nos vídeos, entendeu?

Felipe: Sua família então te apoiou de cabeça?

DJ Ramon Sucesso: Mais ou menos, só no começo mesmo que não aceitaram muito, mas teve que aceitar porque era isso que eu queria.

Felipe: Se não fosse o funk e a produção, o que o Ramon faria? Existe alguma coisa que você faria ou aprenderia a fazer se não fosse produtor?

DJ Ramon Sucesso: Acho que não sei, o futuro Deus que ia falar, porque tipo, toda pessoa quando nasce tem o sonho de ser um jogador de futebol, né? Aí eu treinava e chegou um tempo da minha idade que eu não treinava mais e não queria saber mais daquilo, aí eu botei isso no meu coração que queria ser DJ, alguma coisa assim tá ligado?

Felipe: Enquanto você faz suas alterações de realidade totalmente malucas, vemos o quão difícil e tecnicamente demandante é manejar a aparelhagem, a mesa de DJ. Nisso, você sente que fica 100% focado, apenas deixa o sentimento do coração te levar no piloto automático, ou uma combinação de ambos?

DJ Ramon Sucesso: Ali é tudo ao vivo mesmo, incorpora ali, parece que me transformo ali na frente da CDJ e as coisas fluem, mesmo produzindo a música, entendeu?

Felipe: Então é uma coisa bem intuitiva, você vai lá e faz?

DJ Ramon Sucesso: É isso aí.

Felipe: Agora eu queria te perguntar qual é o maior desafio de produzir ou de se lançar na cena, principalmente pra quem tá começando? Qual foi o seu desafio quando você quis mesmo ser DJ e partiu pra cima?

DJ Ramon Sucesso: Foi produzir mesmo, tipo, a dificuldade para produzir, mas depois que pega a manha é só sentar ali bater a cabeça que sai alguma coisa, depois acaba acostumando. Tipo, o cara que eu cresci sendo fã, comecei a ser DJ praticamente vendo ele tocar, hoje em dia ele me ajudou me ensinou a produzir.

Felipe: Ele te apadrinhou? Você poderia dizer que ele te apadrinhou ou é outra coisa?

DJ Ramon Sucesso: Sim sim, hoje em dia somos amigão!

Felipe: Pelo funk ainda ser bastante marginalizado, você acha que a mídia ou os espaços mais tradicionais que cobrem música no Brasil evitam dar espaço para essa cena mais inovadora/vanguardista do funk a qual você mesmo faz parte?

DJ Ramon Sucesso: Sim sim! Acho que por muitas coisas que eu lancei com nota alta na Europa já era pra ter chego em muitas mídias tá ligado? Na televisão, jornal, não foi uma coisa simples que todo mundo faz.

Felipe: Já teve alguma vez em que você pensou: “Caralho, essa música daria um funk muito bom”, mas quando foi tentar colocar em prática deu tudo errado? Ou melhor, quais músicas são um desafio para você usar?

DJ Ramon Sucesso: Eu acho que tipo assim, o maior desafio que eu tive até hoje foi uma música internacional, em inglês. Deram nas minhas mãos pra que eu produzisse para um tipo de funk que eu toco, tá ligado? Mas tipo assim, eu não achei uma coisa difícil não; foi uma missão pra mim fazer, só que eu consegui fazer, tá ligado?

Felipe: Então pra ti não tem essa não, tu consegue, mesmo que tenha a dificuldade vai lá e faz?

DJ Ramon Sucesso: Sim.

Felipe: Sexta dos Crias foi distribuído pelo Bandcamp, que é bem mais justo quanto à monetização de artistas. Mas você cogita lançar coisas mais focadas no Spotify e outros aplicativos de streaming que, apesar de serem mais acessíveis pro público, são mais injustos com os artistas?

DJ Ramon Sucesso: Pretendo sim, pretendo sim, igual o... acho que já vou explanar aqui, mas eu não explanei ainda nas minhas redes sociais (hahaha), tá pra sair meu álbum, vai sair no Spotify e nessas plataformas assim.

Felipe: Conhecemos o DJ Ramon Sucesso como o cara da Sexta dos Crias, o manipulador de realidades, sempre com gás ilimitado e energia contagiante, mas você tem aqueles momentos em que é difícil produzir, sintetizar a música? Claro que a sua cabeça pode ter uma criatividade inesgotável, como já vimos ser o caso do LP Sexta dos Crias, mas o que você faz quando não há vontade de estar ali, mantendo o set por mais uns minutos, umas horinhas, quando o material não parece bom o suficiente, como se sente?

DJ Ramon Sucesso: Então, tipo assim, eu acho que todo produtor tem um dia que sai alguma coisa, e tem um dia que o produtor está lá, batendo cabeça e fala: “ah, mano, hoje não dá”. Eu mesmo tenho isso, mas às vezes em vez de ficar sentado tentando produzir e não conseguir fazer o que faço, eu vou e escrevo música, sabe? Eu canto e faço trap, mas não solto, deixo lá, aí eu vou ver alguma coisa, e vem alguma coisa na minha mente, porque tipo assim às vezes quando tu não tem ideia tu fica escutando música e daqui a pouco percebe: "Caraca, vou fazer um bagulho”, assim e vai.

Felipe: E o trap pra ti é tipo uma válvula de escape, né? Ai tu escuta e mete bala na produção?

DJ Ramon Sucesso: É! Aí vêm as ideias.

Felipe: Apesar da gente já conhecê-lo pelos vídeos de sexta-feira, muitos só foram ter acesso ao seu trabalho e saber quem era o DJ Ramon Sucesso através da crítica da Pitchfork sobre o Sexta dos Crias. Como você avalia toda essa visibilidade?

DJ Ramon Sucesso: Ah, deixa eu te contar, fiquei muito feliz de ver aquilo lá! Eu meio que não tinha visto as notas em comparação com outros artistas que compararam com outros álbuns lá (no site da revista) eu meio que não tinha visto, então quando vi, fiquei felizão, tomou uma proporção muito alta e me ajudou muito. O disco me ajudou muito, mas a Pitchfork também, soltando a nota e a crítica ajudou demais na minha carreira e nas minhas redes sociais.

Felipe: Entendi. Focando mais nessa questão de visibilidade, teve um aumento em sua procura pro show?

DJ Ramon Sucesso: Teve muito, muito mesmo, tô com três turnês marcadas na Europa esse ano.

Felipe: Nossa preocupação máxima é com o Brasil, é claro, mas é impossível não ter a curiosidade de saber como foi ter um disco impresso em vinil no Reino Unido, conta pra gente, como foi a experiência? O convite da gravadora, ver gente comprando o disco, como que foi?

DJ Ramon Sucesso: Do Lugar Alto (nome do selo) que eu gravei?

Felipe: Isso, do Sexta dos Crias.

DJ Ramon Sucesso: Então, foi tipo assim, eles estavam me procurando há alguns anos atrás, só que eu estava numa produtora, mas a produtora acabou que não respondeu eles (Lugar Alto), aí eu saí e meio que minha assessoria ficou de frente e eles mandaram mensagem de novo, ai minha assessoria viu, ai responderam e eu aceitei o convite, mandei ela aceitar o convite que era uma boa.

Felipe: Em relação a gravadora, ela não tinha respondido e tal, mas você sentiu que depois que você saiu da gravadora você teve muito mais liberdade para fazer o disco? Tipo do que se você ainda estivesse na gravadora?

DJ Ramon Sucesso: Não teria feito

Felipe: Não teria feito né, do jeito que tu fez?

DJ Ramon Sucesso: Isso, e muitas coisas também…

Felipe: E agora falando que o funk tá cada dia mais ganhando o mundo...

DJ Ramon Sucesso: Rompendo barreiras!

Felipe: Rompendo barreiras sempre, e é ótimo, o funk é música brasileira raiz... Não poderíamos deixar de perguntar sobre o que você pensa da expansão do gênero, ainda mais com os gringos tentando, inclusive, replicar o funk aos seus próprios moldes?

DJ Ramon Sucesso: Eu acho que não tenho nada contra. É tudo pro funk; não tem barreira, tá ligado? É um bagulho que, querendo ou não, um está ajudando o outro.

Felipe: Muitas pessoas acham que produzir é algo fácil, ou então que qualquer um pode fazer. Qual a sua visão sobre esse assunto? Tem que ter técnica ou tem que ter paixão?

DJ Ramon Sucesso: Acho que tem que ter os dois. Você tem que amar o que você está fazendo, que tipo assim, não é só você sentar ali e fazer de qualquer jeito, você tem que fazer por amor. Tem muitas vezes e tem muita gente também que está ali no ramo, mas que tá pelo dinheiro e não pelo funk, tá ligado?

Felipe: Se você pudesse escolher, tem algum artista, MC, ou produtor hoje, no mundo inteiro, que você gostaria de fazer uma colaboração?

DJ Ramon Sucesso: Numa música, beat? Acho que hoje em dia na minha pegada que eu toco no funk não tem ninguém mesmo. Tenho contato com todo mundo e amizade com todo mundo, aí hoje em dia eu posso chamar qualquer um pra fazer a parte da putaria, no modo que faço as minhas músicas. Mas agora, no mundo todo assim, eu falo pra todo mundo que eu só queria fazer com um MC que eu sou fã que é o MC Kako, eu sou muito fã e queria fazer uma música com ele.

Felipe: O funk é uma parte integral da música brasileira já fazem décadas, mas recentemente uma onda de produtores do mandelão, bruxaria, 150bpm e, até o próprio beat bolha, estão ganhando destaque em meio a nomenclaturas como “de vanguarda”, “experimental” ou semelhantes. Qual sua opinião em estar no centro das discussões sobre o funk atual em um patamar tão alto? E, se me permite perguntar, acha que tem uma diferença óbvia entre o funk do passado e o atual nesse quesito de “experimentalismo”?

DJ Ramon Sucesso: Eu acho que tipo, tem diferença em algumas coisas, porque funk do passado não xingava tanto igual hoje em dia, mas hoje em dia a gente já acha normal. Se o funk de hoje em dia fosse lá do passado, os outros iam discriminar muito mais do que o funk já é discriminado, porque querendo ou não o funk já é muito mal visto na boca de algumas pessoas... Mas aí se tem diferença é pouca coisa.

Felipe: Poderia nos dizer, num horizonte próximo ou não, em que você anda pensando para o futuro?

DJ Ramon Sucesso: Acho que agora, no momento, meu pensamento é muito mais voltado para botar meu álbum ali pra bombar, estourar a música do meu álbum e ele fluir. Acho que é mais isso.

Felipe: Já está trabalhando nele? Se puder falar…

DJ Ramon Sucesso: Sim! Ele vai ter quatro faixas, e já tem duas faixas prontas, faltam mais duas.

Felipe: Tem algo que você gostaria de indicar para nossos leitores ouvirem, seja um disco, uma música ou qualquer coisa que você esteja viciado no momento?

DJ Ramon Sucesso: O que é pegada do Rio e que a gente escuta muito, acho que no momento agora, tipo o que está estourando, é MC Rodrigo CN e MC Saci!

Felipe: Então você indica esse dois aí para os nossos leitores ouvirem?

DJ Ramon Sucesso: É isso aí!

Felipe: Tem algo a mais que você gostaria de nos dizer?

DJ Ramon Sucesso: Eu gostaria de falar do funk que eu disse que está rompendo barreiras, porque esqueci de falar na hora que você perguntou isso. Eu fui contratado para uma festa de casamento aqui no Rio, o amigo era gringo e veio de Nova Iorque — mandar até um salve aí pro James — e ela (a noiva) era muito meu fã, aí ele casou com uma brasileira e fez a festa aqui no Rio só para me contratar e tocar no casamento dele.

Felipe: Que massa! Então, Ramon, muito obrigado pela entrevista, por ter topado em participar e ter separado um tempo pra falar com a gente!

DJ Ramon Sucesso: Eu que agradeço vocês, obrigado pelo convite, é uma honra estar participando aqui!

Condução: Felipe Ferreira
Produção: Brinatti e Vit
Perguntas: Redação
Edição: Matheus José

Aquele Tuim

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