
3/5
Wolf Alice nunca foi uma banda de meio-termo – desde My Love Is Cool (2015), seu som já delineava uma divisão clara: ou se conecta, ou se distancia. O caminho que percorreu, do indie punk grunge das primeiras fases até o ápice de Blue Weekend em 2021, criava a expectativa de uma continuidade dentro do terreno do shoegaze e dream pop. Contudo, o novo álbum surpreende ao não seguir exatamente esse caminho, oferecendo algo que mais parece uma expansão melódica e emocional do que uma simples continuidade estilística.
Aqui, o melódico assume o centro do palco, não como um detalhe ornamental, mas como um fio condutor que articula o instrumental – que se comporta mais como uma rede de suporte do que como concorrente. Essa escolha transforma o disco em uma experiência em que a expressividade se revela não só nos picos mais intensos, mas também nas transições delicadas e nas dinâmicas controladas, sem exageros ou algo caótico.
Por vezes, é possível notar a influência, ainda que sutil, do glam e soft rock, com suas batidas mais marcantes e uma produção limpa, que dá ênfase às melodias e aos poderosos batimentos de bateria. Além disso, a sonoridade polida também carrega influências do folk, com camadas suaves de instrumentação e arranjos detalhados, tipicamente celebrados por sua teatralidade. No entanto, essa mesma sonoridade ganha uma interpretação mais íntima. A energia da banda permanece, mas se transforma em um discurso menos performático e mais vulnerável, repleto de ironias intensas e nuances que convidam à reflexão silenciosa.
As faixas, por sua vez, constroem uma narrativa que oscila entre a exposição crua e o questionamento da própria existência. Em “Thorns”, o confronto com a dor não é uma catarse, mas um debate sobre se reviver o sofrimento apenas o perpetua. Já “Bloom Baby Bloom” carrega o peso do cansaço e da renovação de metáforas que beiram o poético, sem perder o peso emocional. Por sua vez, “Just Two Girls” se destaca pela crueza das banalidades do cotidiano, uma espécie de liberdade despojada de idealizações. Em contraste, “Leaning Against The Wall” mergulha na fragilidade do amor que se transforma em espetáculo, um questionamento sobre a autenticidade dos afetos performados.
O desdobramento emocional segue em “Passenger Seat”, onde a memória e a dependência criam uma melancolia confortável, uma trilha sonora para a saudade – sem dramatizações desnecessárias, mas com peso real. Já “Play It Out” traz o tema do envelhecimento sob um prisma libertador, rejeitando qualquer rótulo e valorizando os vocais num tom quente e dramático.
O álbum caminha entre o incerto e acolhedor em “Safe in the World”, enquanto “Midnight Song” celebra a resistência e a identidade através da performance, lembrando que a arte também é uma forma de resistência. “White Horses” ressoa como um manifesto, reafirmando a construção voluntária de vínculos que ultrapassam laços tradicionais. Por fim, o grande destaque do álbum, “The Sofa” nos oferece um olhar generoso sobre a complexidade do eu – selvagem, contraditório, resignado, porém acolhedor. Um convite a aceitar os momentos simples, a desarmar a armadura social e a encontrar paz no próprio espaço, ainda que imperfeito.
Portanto, The Clearing, com sua sonoridade introspectiva e cheia de contrastes, revela um espaço de vulnerabilidade e descoberta, sem se preocupar em seguir as expectativas ou os caminhos já trilhados. Não é uma obra que se impõe, mas que convida a uma reflexão mais silenciosa e sutil, mostrando que, mesmo longe da perfeição, há beleza nas imperfeições e nas nuances mais delicadas.
Selo: Columbia Records
Formato: LP
Gênero: Rock / Soft Rock, Glam Rock