Crítica | CORTAVENTO


★★★☆☆
3/5

Quando JOCA lançou o excelente A Salvação é Pelo Risco – o Show do JOCA, em 2019, o contexto era ideal: o boombap, som que domina o álbum, já estava consolidado e pulsava em eventos de rua, batalhas e rodas culturais. Sua produção trazia o sabor nostálgico e empoeirado da época, assim como suas letras, que misturavam atualidades com esperança, como se o artista fosse um entre tantos empenhados em oferecer uma perspectiva social, política e romântica, tudo ao mesmo tempo. De lá pra cá, muita coisa mudou. O boombap, especialmente após a pandemia, perdeu força com o esvaziamento dos espaços que lhe davam corpo: a rua, o encontro, o improviso coletivo. O que resta, então, para JOCA? Em CORTAVENTO, sua nova fase lida bem com essa transição no campo das ideias. Ele continua filtrando tudo por sua lente pessoal e, mais uma vez, não compartimentaliza os temas, mas os une sob um mesmo olhar. São várias as faixas que se perdem (no bom sentido) em dezenas, talvez centenas de detalhes: apontamentos lançados em momentos distintos, frases que funcionam em camadas, citações cuidadosamente escolhidas.

O desafio está na forma. Ao se distanciar de uma sonoridade tão marcada, JOCA opta por novas texturas, buscando dar conta de suas conquistas e percepções atuais. Daí a presença notável de grandes nomes como Antonio Neves e Thiago França, entre outros, que surgem aqui não exatamente como uma estratégia, mas como consequência natural da trajetória e reconhecimento do artista. Ele evoca a ancestralidade logo na abertura, “EXUBERÂNCIA”; recorta passagens do cotidiano com rimas pontuais em “CHINELIN”; e referencia a música de raiz negra com frequência, como em “BADU & 3000”, faixa que traz versos excelentes de Ebony. Apesar desses acertos, CORTAVENTO parece não conseguir sustentar a liga de suas novas incursões sonoras. Há momentos em que a estrutura das faixas soa desconectada, como se JOCA estivesse rimando por cima da música, e não dentro dela, o que parece óbvio a se fazer, não fosse a falta de força desses instrumentais, beats e etc. em se imporem ao lado das rimas. Falta encaixe. Essa incongruência, por mais instigante que seja em seus fundamentos, contrasta com a expansividade que o artista parece almejar nesse momento da carreira. O resultado é um disco bastante irregular, que escorrega na forma com que foi feito.

Selo: UnitedMasters LLC
Formato: LP
Gênero: Hip Hop / Música Brasileira

Matheus José

Graduando em Letras, 24 anos. É editor sênior do Aquele Tuim, em que integra as curadorias de Funk, Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

Postagem Anterior Próxima Postagem