Crítica | Clube da Mariposa Mórbida


★★★★★
5/5

Desde o título, Clube da Mariposa Mórbida já anuncia sua vocação surrealista: um disco em que cada faixa se apresenta como um universo próprio, construído por atmosferas densas e hipnóticas. A união entre Akira Umeda (historiador e artista multifacetado do interior paulista, que na gravadora Lugar Alto consolidou uma abordagem experimental ligada ao universo queer) e o duo britânico Metal Preyers (que desde seu debut homônimo explora colagens sombrias entre industrial, música ambiente, gêneros africanos como singeli, e drill) resulta em uma obra que se afirma pela consistência de sua estética e pela criação de mundos sonoros instáveis.

Logo na abertura, “One Eyed Weasel” injeta urgência com um funk desacelerado atravessado por vozes tecnológicas e sintetizadores metalizados, instaurando o clima suspenso que permeia todo o álbum. A partir daí, cada faixa desenvolve à sua maneira essa lógica, revelando diferentes camadas de experimentação: a faixa-título se ergue sobre sintetizadores graves que se entrelaçam com vocais dispersos; “Immolation Meditation” trabalha batidas irregulares em meio a texturas ruidosas; e “Boi de Piranha” embaralha o ritmo até o limite da desorientação. Em contraste, “Rato Gordo” aparece como respiro melódico e onírico, antes que “Cut Throat Mickey”, a mais longa do disco, concentre a cadência e o suspense que organizam momentaneamente o fluxo sonoro.

Mais do que um amontoado de faixas experimentais, o disco é guiado por uma lógica de atravessamentos: entre Brasil e Inglaterra, entre sonoridades populares e experimentais, entre memória cultural e invenção de futuros possíveis. É nesse ponto que o projeto encontra uma dimensão próxima ao afrofuturismo, não como ilustração do exótico, mas como reorganização radical de referências para compor novas realidades sonoras. Do mesmo modo, sua relação com o universo queer se manifesta não apenas como rótulo, mas afirmando a fluidez como método de criação. Dessa forma, o que Umeda e o duo britânico conseguem ao unir suas ideias, é colocar em Clube da Mariposa Mórbida a prova de que sabem transformar persistência em narrativa, ruído em atmosfera e criar na repetição sensualidade, tensão e imersão.

Selo: Nyege Nyege Tapes
Formato: LP
Gênero: Experimental / Field Recording, Industrial, Eletrônica
Leonardo Zago

Formado em Comunicação Social com ênfase em Midialogia, 27 anos. Amante de cinema e música. No Aquele Tuim, integro a curadoria de música Eletrônica e Experimental.

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