Crítica | just like any other day (어느날): background music for your mundane activities


★★★★☆
4/5

Ao longo dos últimos 20 anos, Okkyung Lee percorreu diversos caminhos em seu desenvolvimento criativo e artístico, estabelecendo-se a par e ao mesmo tempo em contraste com os símbolos ocidentais da música experimental: explorou o free jazz, concentrou-se na improvisação livre, mergulhou na música ambiente, abraçou o noise e expandiu suas influências eletrônicas, manipulada por seus códigos de vanguarda. Por muito tempo, seus álbuns foram – e ainda são – sinônimos de uma exploração sonora desenfreada. É de se perguntar se, durante todo esse tempo, ela considerou desacelerar, e é exatamente isso que Okkyung Lee faz em seu novo álbum, just like any other day (어느날): background music for your mundane activities, um disco extremamente intimista, objetivo em suas ideias e que, apesar de sua simplicidade, ainda incorpora a máxima que guiou Lee ao longo de sua prestigiosa carreira: a busca por novos sons. Composto apenas por um teclado e um gravador barato, além de um computador, o álbum adere a um tema que ressoa com seu meio criativo, fazendo-nos questionar a necessidade da música como arte, seus objetivos e o que muda da audição cotidiana para a audição atenta, marcada por vieses de produto. Esse questionamento da compositora surge como uma forma de fundamentar sua abordagem, que constitui um restabelecimento de ideias.

É por isso que aqui ela deixa de lado o diálogo interminável com o violoncelo que a acompanhou nos últimos anos e opta por um minimalismo barroco ligado às suas raízes sul-coreanas, algo que pode ser visto na construção de melodias repletas de ornamentos lúdicos, concebidas através de intervalos que instigam um caráter lírico e contemplativo, próximo de uma naturalidade, organicidade, que se torna reconhecível e, simultaneamente, muito seu. Trata-se de uma obra que afirma seu retorno à Coreia após ter vivido nos Estados Unidos desde o final da adolescência. Além disso, just like any other day (어느날): background music for your mundane activities tem em seu cerne a precisa habilidade composicional de Okkyung Lee em dar vida ao que pode ser facilmente decifrável diante do observador habitual dos estilos que ela busca traçar com sua personalidade. Em “crows over my shoulder (take me)”, seu dedilhado aumenta repentinamente o volume, a densidade do toque, como se avançasse nas escaladas que ela cria em torno do doce fluxo e refluxo do ritmo que se altera subitamente, transforma o tom e finalmente entra em um mar de texturas, cobrindo as notas finais com uma névoa escura, um zumbido que nos desloca da calma referencial em que havíamos sido colocados. É um dos maiores momentos do álbum, uma vitrine da inquietação sem fim de Okkyung Lee.

Compre: Bandcamp
Selo: Shelter Press
Formato: LP
Gênero: Experimental

Matheus José

Graduando em Letras, 24 anos. É editor sênior do Aquele Tuim, em que integra as curadorias de Funk, Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

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