Crítica | A Danger to Ourselves


★★★★☆
4/5

Se você navegar pela discografia da musicista colombiana Lucrecia Dalt, notará uma vasta gama de lançamentos, e se sentirá atraído por pelo menos um que o fisgará e despertará o desejo de ouvir tudo o que ela lançou. A capacidade de Dalt de inspirar essa atração vai muito além da diversidade de temas que aborda, de seus sons, quase sempre voltados para a eletroacústica, ou de sua abordagem de um tipo de experimentalismo que nós, latinos, consideramos mais comum do que estranho. E é justamente aqui que A Danger to Ourselves encapsula perfeitamente a capacidade distinta da artista de retrabalhar suas raízes, criando algo imageticamente novo e surpreendente – talvez seja o álbum que fará você querer devorar sua discografia. Seu som é mágico, sem fronteiras, brinca com acordes de piano, cordas e demais estruturas que, nas mãos dela, podem ser capazes de gerar texturas instrumentais que entram em um duelo tonal, ora explosivos, ora contidos; tudo parece ir e vir numa penumbra. É meio assustador, mas cativante, no sentido profundo da palavra.

Nesse ponto, a ideia de “dark jazz” e “ambient pop” que algumas pessoas têm usado para classificar o disco, se fundem aos próprios avanços estéticos que Dalt cria, com instrumentos e batidas feitos de forma caseira. É um estilo de produção que serve tanto para destacar o que chama a atenção quanto o que parece estar escondido — é por isso que as melodias ganham um certo volume, que, por mais distantes que sejam da similaridade com obras do mesmo gênero, ainda são acessíveis. Devido a isto, nada soa como exótico, difuso, ou extremamente fora da caixinha para quem muito compreende a raiz desses sons, que na voz dela se realçam ainda mais. É como se Natalia Lafourcade se encontrasse com Laurie Anderson e surgisse dessa união algo que sequer pudéssemos nomear, tatear. Essa é a densidade de pensamento composicional que Lucrecia alcança em diversos momentos, sempre à espreita de algo que possa vir a ser seu grito, seu chamado; é o caso de “mala sangre”, que carrega todo o tom do disco em termos sonoros e líricos. É uma concatenação de símbolos que beira o surreal, de fato é. Mas nos sentimos tão comovidos que acreditamos que não passa de algo real, vivenciado e vivenciável – o momento em que seus vocais de fundo parecem uivar como o vento em meio ao farfalhar dos metais e da percussão é o que dita a intenção de Lucrecia Dalt de exibir seu perigoso encantamento. De repente, Buu!

Selo: RVNG
Formato: LP
Gênero: Experimental

Matheus José

Graduando em Letras, 24 anos. É editor sênior do Aquele Tuim, em que integra as curadorias de Funk, Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

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