Crítica | Echo of Being / Grace In Rot


★★★★☆
4/5

A dupla Neti-Neti, composta pela vocalista Amirtha Kidambi e pelo percussionista Matt Evans, lança seu mais novo trabalho, Echo of Being / Grace In Rot, descrito como uma “poderosa meditação sonora sobre o luto”. É, no entanto, um material distante de uma efetivação desses temas que se endireita para ares meditativos sob o ponto de vista da passividade do termo, ou calmos. A segunda faixa do registro, “Every Wound is a Weapon”, deixa claro do que Echo of Being / Grace In Rot se trata: enquanto Amirtha Kidambi trabalha com a forte impressão de sua voz – que remonta a tradições vocais do sul da Ásia –, Matt Evans parece expandir seus batuques para infinitas direções, numa dinâmica de improviso que choca pelo discernimento e pela concatenação que ambos desempenham ao longo da música. O disco foi gravado em um único dia, numa sessão ininterrupta, com toques ao vivo e um resultado que dá todos os significados do que a música pode ser quando pensada como meio de livre expressão.

As texturas que a bateria de Matt desenvolveu nesse processo são um destaque à parte. Há que se impressionar pelo canto de sua parceira de dupla, mas seus toques rápidos, ágeis – como se precisasse criar o caminho exato para que Kidambi possa percorrer com sua voz – são o que tornam tudo mais profundo em termos de composição instrumental. Essa impressão se intensifica ainda mais em momentos em que a percussão dá espaço para o drone; é o caso de “Memory in Veil”, em que a crueza do tema se efetiva, seja pela temática da memória que o título esbanja, seja pelos longos segundos de calmaria, que se consolidam em “Alive in the Belly of a (Green) Bird”, peça de sete minutos de duração que vai crescendo aos poucos, lentamente, até atingir o epicentro da força gravitacional do disco, com uma forma absurda de união criada por eles, como se o diálogo aqui ganhasse um contorno ritualístico até então desconhecido.

Enquanto isso, “Devoted Light” expande outra frente de Echo of Being / Grace In Rot. Há nela os drones, a calmaria vocal que parece descansar após uma intensa explosão catártica comandada por ambos os artistas e elementos de eletroacústica, com sinos e um tom melódico do vocal de Amirtha Kidambi que sofre poucas variações, segue plano, quase estático, como um mantra de fato. É uma investida no sombrio, que causa arrepios na coluna ao passo que entoa o tom meditativo que tanto parece pregar. É o ponto alto, a comunicação do sentimento que causam frente às tragédias, ao luto e ao momento que vivemos na atualidade. Nunca uma música fez tanto sentido em sua despedida do ouvinte na primeira audição.

Compre: Bandcamp
Selo: Dinzu Artefacts
Formato: LP
Gênero: Experimental

Matheus José

Graduando em Letras, 24 anos. É editor sênior do Aquele Tuim, em que integra as curadorias de Funk, Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

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