Crítica | Drop 7



★★★☆☆
3/5

Em novos lançamentos de grandes artistas sempre ocorre um joguinho de expectativa cego. É quase um cálculo matemático construído a partir de fórmulas delusionais, medindo descuidadamente os gêneros, estéticas, nível de profundidade e objetivos internos de todos os antigos trabalhos de um artista a fim de “descobrir como será o próximo disco”, como se ele devesse, por obrigação, seguir com uma sonoridade coerente, uma evolução esperada ou uma personalidade única, caso contrário "era só fazer um projeto alternativo".

Mas, mesmo com criticismos que digam justamente o contrário, é facilmente notável que Drop 7, antes de tudo, segue exatamente essas “regras” pseudo calculadas acima. Já que, se você prestou um pouco de atenção na trajetória de Little Simz, duas características de sua carreira ficam evidentes:

Primeiro, que seus EPs são destinados a testes de novas sonoridades, direções a se tomar e, no geral, experimentações suaves e diversão plena. E, segundo, que seu trabalho recente teve um enfoque em ritmos derivados das mais diversas regiões da África, tanto dentro quanto fora dela, seja pelos samples, testes passados, ou pela sua lírica. Logo, é natural que ela tente se aproximar e experimentar com o mandelão e o grime, dois gêneros derivados, respectivamente, da cultura negra do Brasil e Reino Unido.

Porém, mesmo que o EP não obedecesse tais “regras”, não teria absolutamente nada de errado, de chocante ou indesejável nisso. Partir de um estilo lírico, denso, pé-no-chão, baseado no orgânico e luxuoso para um esteticamente futurista, cibernético, descompromissado na lírica e fortemente baseado em atmosfera não deveria ser visto como um problema. Na verdade, essa mudança denota uma versatilidade, liberdade e paixão pelo fazer artístico gigante — quiçá uma muito maior do que a daqueles rappers líricos que ficam anos e anos fazendo o mesmo álbum, não apresentando evolução alguma ou sensibilidade para mudar.

Portanto, a melhor forma de analisar um trabalho como Drop 7 vindo de um catálogo tão rico como o de Little Simz não é comparando propostas, identidades e sonoridades essencialmente estranhas entre si — especialmente não dizendo que a artista “decaiu” de um estado que não representa em nada o álbum —, e sim em ver o que a rapper tenta trazer à mesa com ele, quais são as provocações abordadas e o quão bem o produto final apresenta tais características. E, ao analisar de tal maneira, é difícil chegar em uma conclusão diferente de que o projeto é fascinante.

O clima é sombrio, não apenas nublado como úmido, fúngico e terreno — ou seja, apresenta uma qualidade natural e desconfortavelmente viva em muitos de seus momentos —, mas, mais importantemente, é futurista enquanto realidade, ultrapassando as barreiras do mundano ao combinar percussões derivadas do mundo físico com baixos digitais, bateria eletrônica e sintetizadores pungentes. O resultado é indecifrável, mesmo que muito acessível e dançante.

Dos gritos aprisionados em cápsulas criogênicas e repetição fantasmagórica de “Mood Swings” ao grime aterrorizante e encantador de “Torch”, Little Simz, não inesperadamente, apresenta uma maestria em manejar instrumentais complicados e provocar com performances incrivelmente versáteis. Cada valioso segundo do EP é muito bem utilizado para criar uma atmosfera sombria e singular, que, como a capa, consegue conversar em termos iguais com o biológico e o tecnologicamente distópico.

Assim, não há nada no mundo como Drop 7, e por mais que nem todas as faixas sejam destaques absolutos, os testes de Simz se provaram dignos de enaltecimento, pois têm uma linda capacidade de causar um fortíssimo transe ao passo que é incrivelmente divertido e convidativo. Uma interseção exímia de sensibilidades pop, experimentalismo pessoal e música eletrônica negra.

Selo: AWAL, Forever Living Originals
Formato: EP
Gêneros: Hip Hop / EDM, Grime, Funk Mandelão
Sophi

Sophia, 18 anos, estudante e redatora no Aquele Tuim, em que faço parte das curadorias de Rap e Hip Hop e Experimental/Eletrônica e Funk.

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