Crítica | Música Elétrica


★★★★☆
4/5

Há um movimento muito interessante na música eletrônica/experimental: quando artistas que sempre produziram a partir de instrumentais, vocais sampleados ou fragmentos vocais de parcerias passam a usar, pela primeira vez, a própria voz. Os exemplos são vários, de Arca a Lucy Liyou, mais recentemente. Mais do que coragem, esse gesto representa um avanço criativo importante, pois, além do som, surge também a preocupação com a lírica e com os temas que o trabalho pretende transmitir.

Música Elétrica, de Chediak, surge exatamente a partir disso. É a primeira vez que o produtor – já envolvido em trabalhos com nomes como Pabllo Vittar, DUDA BEAT e Deize Tigrona, entre outros – coloca sua própria voz em primeiro plano. E, embora o disco exiba uma notável diversidade de sons, transitando com liberdade por batidas que vão do UK garage ao funk, é na emoção impressa por suas narrativas pessoais que ele alcança profundidade. São essas emoções que preenchem o vazio que as camadas sonoras poderiam deixar caso ele não tivesse escolhido se expor, se colocar, ao longo das 14 faixas.

Chediak conta que Música Elétrica começou a ganhar forma em 2018, quando lançou o EP Moments Spent With You e sentiu a necessidade de criar algo que refletisse não apenas seus gostos musicais, mas sua personalidade. É curioso pensar nesse tipo de contextualização, porque as composições deste disco — tanto na lírica quanto na estrutura — continuam revelando muito de seu repertório como ouvinte. E talvez seja justamente por isso que o resultado funcione tão bem: há algo de potente em ouvir músicas que dialogam com aquilo que nos é familiar, em vez de provocar uma estranheza forçada apenas pela tentativa de rompimento.

Veja, por exemplo, como “pra vc” consegue dosar bem sua ruma de elementos: os vocais rastejam, enquanto fragmentos ao fundo constroem uma atmosfera noturna que remete aos momentos mais “pop” da discografia de Burial, embora com uma diferença clara de intensidade. Já “LÁ FORA” ecoa o pop eletrônico de Troye Sivan em Something To Give Each Other, aproximando-se especialmente do terreno de “Still Got It”.

Em todos esses exemplos, o que se percebe é o tom confessional de Chediak, seja nas temáticas mais universais – como em “VOLTA”, onde canta sem olhar para trás, mas com o retrogosto da dor e do medo ainda na boca: “Eu não quero mais você aqui / Eu não quero te ver nunca mais” –, seja na vontade de ir além, de reconhecer em si a necessidade de um impulso e de um contato íntimo, como em “DiFERENTE”. Nessa faixa, ele empresta a captação empoeirada e ruidosa à la Jane Remover para cantar sobre o que restou em seu coração: “Eu tenho tanto pra te falar”. É uma das melhores formas de encerrar essa jornada pessoal, emocional e de busca. Não tenho dúvidas de que ele o fez muito bem.

Compre: Bandcamp
Selo: SPEEDTEST RAVE
Formato: LP
Gênero: Eletrônica / Pop

Matheus José

Graduando em Letras, 24 anos. É editor sênior do Aquele Tuim, em que integra as curadorias de Funk, Jazz, Música Independente, Eletrônica e Experimental.

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