Clássicos do Aquele Tuim | Rain Dogs (1985)


★★★★☆
4/5

Rain Dogs é estranho para qualquer pessoa que decide ouvir a discografia de Tom Waits desde o começo. Esse foi o meu caso quando eu tinha por volta de 15 ou 16 anos. Sendo bastante sincero, eu não lembro de ter gostado desse álbum quando o ouvi pela primeira vez. É um disco que soa caseiro, pouco elaborado superficialmente, ou apenas qualquer coisa que deu na telha de fazer.

E provavelmente é isso mesmo, o ouvinte vai perceber que já não há os grandes arranjos de cordas de “Ruby’s Arms”, ou o blues jazzístico de “I Hope I Don’t Fall In Love With You”, sequer a polidez técnica de “Swordfishtrombones”, mas sim uma aproximação entre Waits e a sua banda. Soa mesmo como uma diminuição de espaço, mas um aumento na experimentação. Do cabaret à polka ao rock experimental, uma ligação que demora a fazer sentido, mas que, sem dúvidas, eleva o status artístico de Tom Waits a outro nível.

A referência poética vem certamente de Bob Dylan (e o que nos EUA não vem?). Mas para não falar do óbvio, é interessante destacar como esse movimento de Tom Waits se assemelha ao que fez Tim Buckley na virada dos anos 1960 para 1970 com seus álbuns. O que, de certa forma, é bem curioso, visto que já no primeiro lançamento de Tom Waits, o próprio Tim Buckley gravou covers de suas músicas, ambos artistas possuíam admiração mútua.

Um dos principais aspectos destacáveis diante dessa mudança técnica e estética que se apresenta em Rain Dogs é a forma quase ameaçadora que a voz de Tom Waits se impõe nos instrumentais. Apesar da gravação soar amadora, especialmente no que diz respeito à captura dos instrumentos e vocal, existe uma dissonância entre a técnica de alto nível dos instrumentistas — além das texturas que aparecem de instrumentos pouco usuais para um disco de rock, como a marimba e o acordeão. Por isso, músicas como “Diamonds and Gold” às vezes soam como algo que poderia ter vindo diretamente de Captain Beefheart.

Em termos poéticos, há uma influência forte da poesia beat, temas que sempre variam do romance à incompreensão do estado das coisas, e a indignação com o mundo e com o país que se vive, que surge da contradição da liberdade pregada e a prisão sentida. Tom Waits é muito feliz nas escolhas poéticas, são músicas que merecessem ser analisadas pelas suas letras, e por mais que seja comum que músicas possuam letras, é incomum que elas mereçam tanto destaque quanto a parte instrumental.

Para quem insiste em dizer que não houve bom rock nos Estados Unidos, Rain Dogs aparece como uma forma de rebelião contra isso. E quarenta anos depois, permanece um disco absolutamente essencial para quem tem interesse na história da música, para os fãs de rock, para os fãs de uma boa experimentação dentro da música popular, ou só para quem gosta mesmo de música.

Selo: Island Records
Formato: LP
Gênero: Rock / Rock Experimental
Tiago Araujo

Graduando em História. Gosto de música, cinema, filosofia e tudo que está no meio. Sou editor da Aquele Tuim e faço parte das curadorias Experimental, Eletrônica, Funk e Jazz.

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