
4/5
Em É Disso que Eu Me Alimento, Nanda Tsunami nos serve um banquete emocional onde o que é erótico não é só pele, mas também falta, urgência e fome, uma necessidade que nasce do desejo de ser tocada, ouvida, amada, sentida por inteiro. Se em seu primeiro EP, Tsunami Season, a artista já havia posicionado o prazer como território de poder, aqui ela escancara que esse poder é construído também sobre buracos: feridas abertas, afetos negados, amores mal resolvidos e o silêncio imposto a corpos que sempre quiseram muito, mas puderam pouco.
Ao lado de produtores como Mello Santana, Cassiano Franco, Prodite o governante, prodbygdm e nomes como AnjO 005, Agostinhx, sONTH, Deiiv, Brenn!n, Winx, Iamlope$$ e Jiraya, o álbum ganha texturas densas, batidas graves e vozes que soam confessionais. Cada participação amplia o tema central: o desejo não como produto para consumo, mas como fome vital, carência que se assume, potência que se compartilha. O resultado é um manifesto sonoro que recusa a sexualização rasa e transforma o ato de querer em afirmação de vida e vulnerabilidade.
Nanda canta a partir da carne, mas não para ser consumida, ela canta porque precisa, e essa necessidade tem cheiro de saudade, de abandono, de noites longas demais esperando uma ligação. O erotismo que emerge em faixas como “Meu Afeto É Obsceno” é uma mistura de tesão e carência, um desejo de conexão real que pulsa entre versos sussurrados e batidas que colam na pele. As nove faixas se sucedem como bocados mastigados com raiva e prazer, misturando beats de funk, house, trap e nuances melódicas que lembram R&B; aqui, o que é lúdico e sexual é uma forma de dizer que está viva e, também, desejar sem trégua, sem se alimentar de silêncio, neste álbum tudo é dito.
A produção acompanha essa densidade com arranjos sujos, graves encorpados, mas que por vezes se abrem em espaços quase melancólicos, como se o som também pedisse colo. A voz de Nanda oscila entre o comando e a confissão, num jogo de fragilidade e intensidade. Sua voz se transforma em instrumento de afirmação: rouca, doce, agressiva, frágil, e essa é a beleza do disco: assumir que o desejo não vem apenas da potência, deseja-se porque falta. E nessa falta, mora a criação.
Há algo profundamente corporal no álbum: não só nos versos explícitos ou na batida grave, mas na sensação de suor, de cicatriz, de saliva; marcas de quem vive o desejo como urgência e memória. Isso ganha uma força especial no interlúdio “Te Amei Infinito”, em que a batida silencia para dar lugar à palavra crua, confessando afetos que doem e permanecem, é um momento em que o corpo deixa de ser apenas força ou provocação e se revela frágil, lembrando que amar é também se expor, guardar cicatrizes e afirmar a própria humanidade.
É Disso que Eu Me Alimento é um álbum para quem já sentiu o corpo como grito e o silêncio como prisão. Um disco que nos lembra que o erotismo verdadeiro não está no que se oferece, mas no que se quer, com todas as contradições, intensidades e urgências que isso carrega. Nanda não quer só ser tocada: ela quer ser compreendida naquilo que a move. E é justamente isso que alimenta e transforma tudo.
Selo: Independente
Formato: LP
Gênero: Funk / Trap, Hip Hop
Formato: LP
Gênero: Funk / Trap, Hip Hop