
★★★☆☆
3/5
Minha relação com a música, além de analítica para os momentos que escrevo, tem um lado muito íntimo, muitas vezes voltado ao meu estado de espírito momentâneo, o que me faz acreditar que determinados trabalhos sejam definitivamente um dos melhores já lançados, pelo menos no ano em que saíram. Isso aconteceu com moisturizer, da banda britânica Wet Leg, da qual nunca tive contato algum até receber sua indicação de um amigo com gostos musicais parecidos.
Não sei se estava naufragado na ilha deserta que foi a música pop em 2025, com todos os maneirismos do folk/country que têm encharcado os charts sob uma perspectiva ‘clean girl’ de sentir e fazer música, mas o álbum em questão retoma um pouco da ousadia e atrevimento que fazem parte do desejo sexual e romântico nas relações. Isso está presente não só na sonoridade, como na lírica e também nas performances vocais despojadas.
Assim como na capa, muito bem “posada” pela vocalista e, indicada ao Grammy na mais nova categoria de melhor capa, encontramos no disco uma criatura que explora o lado mais animalesco do amor e da luxúria. As guitarras rasgadas que costuram as faixas do álbum dentro de uma lógica dance-punk fazem parte desse dilaceramento emocional traduzidas em som.
Sentimos certa tensão (sexual?) desde o primeiro momento, como em “CPR”, uma música cantada de forma tão pós irônica que não sabemos se é tesão ou uma ameaça, principalmente pelas linhas “is it love or suicide?”. Esse clima de declaração intimidadora toma conta das primeiras faixas de moisturizer, criando uma atmosfera provocativa e certas vezes engraçada, sendo esse um tempero especial do grupo. E, apesar de em muitos lugares encaixarem o trabalho em uma caixinha indie-rock, consigo enxergar melhor o álbum sob um espectro pop, que tem como elemento coesivo não só a guitarra como os arranjos grunge da bateria e uma falta de polimento proposital na mixagem, mas momentos calculados para parecerem mais agressivos.
A estrutura musical e a lógica de composição fazem com que o álbum soe muito mais pop do que qualquer outra coisa, principalmente pela repetição de determinadas linhas em pré-refrões prestes a explodir, melodias catchy marcadas por violões, e sem contar as frases de efeito como “you wanna fuck me, i know must people do”. Admitir isso pode fazer com que o álbum funcione melhor para algumas pessoas, pois a mudança de perspectiva do que se espera de determinado gênero musical faz com que a narrativa favoreça ou prejudique certos trabalhos.
Outra coisa muito bem feita pelo grupo são as pequenas narrativas de amor em cada faixa, que passam de uma chamada para cair no soco na divertidíssima “catch theses fits”, para uma “carta de amor queer” nos moldes do filme Garota Infernal (2009) em “jennifer’s body”. É legal reconhecer o valor de um bom clichê quando nos deparamos com um, sendo o caso da calma “11:21”, que relata a saudade de um amor que se passou ao dizer que “It’s not like the moon forgets to shine / When i’m not with you / But it feels like it just might”.
Muitas vezes, quando ouvimos um álbum que tende a falar somente de amor romântico, é muito comum que isso soe enfadonho e repetitivo, como vemos principalmente nos últimos trabalhos de Sabrina Carpenter Short n’ Sweet e Man’s Best Friend. No entanto, neste caso, temos faixas um pouco mais criativas que as de Carpenter, que falam do amor numa perspectiva muito mais centrada no que o eu lírico deseja do que na dependência de um amor para explorar outras faces da própria existência.
É claro que existem contrapontos, como a faixa “pokémon”, a mais comercial do álbum, que assume uma identidade mais dance acústica, substituindo a guitarra rasgada por baixos e vocais suaves, numa estrutura bem pop, com refrão chiclete e ponte crescente, um suspiro na construção da experiência auditiva e também uma mid tempo muito cativante.
De maneira geral, moisturizer pode não ser o melhor do ano para mim em termos de artisticidade, de profundidade lírica, de sonoridade e de significados, mas certamente se tornou um dos meus álbuns de conforto, por se tratar de um registro refrescante sobre como é agressivo desejar em todas as suas potencialidades. É aquele tipo de música que te faz querer viver, lutar e matar por um amor, mesmo que seja por você mesmo.
Selo: Domino
Formato: LP
Gênero: Rock / Pop, Indie