Crítica | Fancy That


★★★★☆
4/5

“My name is Pink and I'm really glad to meet you”, diz PinkPantheress ao introduzir sua segunda mixtape, Fancy That, lançada na sexta-feira (9). Apesar de jovem, a cantora britânica não é exatamente uma desconhecida na indústria. Suas músicas de curta duração, sua estética Y2K e seu comportamento memético são facilmente identificáveis para aqueles que acumulam mais de oito horas de tempo de tela por dia.

Em seu novo projeto, a artista mergulha de cabeça na frenesia da música eletrônica ao elevar o drum and bass que a consagrou como um ídolo de edits no TikTok. Ela já havia causado boa impressão em sua primeira mixtape, to hell with it, de 2021, alinhada a um bedroom pop aconchegante e de fácil digestão. Mas foi com seu álbum de estreia em 2023, Heaven Knows, que a cantora se mostrou um dos nomes mais interessantes da nova geração de artistas pop.

Se o disco mostrou uma versão polida e lapidada de PinkPantheress, Fancy That jogou tudo pelos ares com o estrondo de um 808 carregado. Aqui não há vocais cristalinos ou instrumentos ao vivo delicados. Quem manda são os beats encorpados e expansivos que emaranham-se entre si. Só há espaço para a luxúria copiosa do dance-pop e UK garage que se acentuam ao longo das faixas.

Quando “Tonight”, o primeiro single, veio ao mundo, já era notável que algo havia mudado em Pink. A música é um charmoso canto de acasalamento, ideal para ser ouvido no período fértil. É a primeira vez que a artista assume uma postura mais explícita nas letras, em que ela canta com doçura: “Você quer transar comigo? / Vem falar comigo”. O coro libidinoso é impulsionado ainda mais com uma esplendorosa linha de baixo e um sintetizador discreto.

“Girl Like Me” e “Stars” mantêm a euforia da pista de dança na mixtape com uma convulsão de synths distorcidos e vocais anasalados que acentuam as melodias dos versos. Já “Noises” e “Nice To Know You” são um retorno familiar ao drum and bass e 2-step em boas formas da artista, com cordas cinemáticas e percussões atônitas. “Romeo” adiciona ainda guitarras sedutoras e dramáticas em uma tragédia britânica sobre um romance contemporâneo fadado ao fracasso — desta vez Romeu é bissexual e emocionado.

É em “Stateside”, no entanto, que a artista demonstra toda sua maestria nesta que é sua melhor música até hoje. O anseio por um par romântico de outro continente é formulado como um hino para os adeptos ao webnamoro. A produção inebriante da faixa conta com o toque mágico do produtor The Dare, responsável pela estrondosa “Guess”, de Charli XCX. As melodias intrincadas repousam confortavelmente com a distribuição de cada elemento pensada com o mesmo rigor de um feng shui.

Fancy That não existiria sem uma seleção abrangente de referências musicais. A introdução com cordas de “Tonight” sampleada da faixa “Do You Know What I'm Seeing?”, do Panic! At The Disco; os sintetizadores de “Illegal” retirados de “Dark & Long (Dark Train)”, do grupo Underworld; até o refrão de “Girl Like Me”, uma interpolação de “Romeo”, da dupla Basement Jaxx. Ainda que dispensáveis em alguns momentos, PinkPantheress consegue incorporar os instrumentais alheios à sua paisagem sonora furta-cor sem grandes perturbações no relevo.

Como mixtape, Fancy That se mostra como o trabalho mais bem estruturado da cantora. Como apoteose da música eletrônica, é a união natural do passado e o futuro da artista na cena. Como produto da cultura envolta no TikTok, é um lampejo de inspiração em que PinkPantheress coloca a indústria musical no bolso em um projeto pensado para ser ouvido em vídeos verticais. Mas ainda assim executado para ser reproduzido até no Windows Media Player.

Selo: Warner Records
Formato: Mixtape
Gênero: Pop / Dance-pop, UK garage

Tobia Ferreira

Emo de banho tomado e jornalista cultural. Formada em Jornalismo pela USP e repórter do Aquele Tuim, em que faz parte das curadorias de Funk e R&B e Soul.

Postagem Anterior Próxima Postagem