
4/5
Quando se fala em ser um criador no meio de um gênero e subgêneros tão vastos como é o funk, é preciso considerar as marcas de autoria e visão artística apresentada pelos artistas em evidência dentro de cada nicho. No caso de Adame, essas marcas estão cada vez mais aparentes dentre as demais mentes criadoras do estilo musical, destacando-se por sua aproximação ousada com gêneros de música eletrônica como o house e techno e também pela sua precisão na criação e combinação de beats.
Neste novo EP, para quem acompanha de perto o trabalho do DJ, já era possível prever que alguns movimentos fossem se concretizar entre essa dualidade do funk com a música eletrônica, isso porque em Músicas para ouvir antes do rolê já haviam algumas prévias desta fusão, também dada à brincadeira com o nome dos dois projetos. Para além do álbum anterior, Adame vem lançando algumas faixas cheias de experimentalismo e cada vez mais desprendidas do funk, como em “Beat Maquinário”, uma grata surpresa em sua discografia, que combina vocais de funk metalizados dentro de uma guerra sonora de raios laser futuristas.
Logo de início, em “Pokpok”, fica perceptível uma síntese do trabalho que, em seu desfecho, se mostra como um híbrido muito bem equilibrado entre funk e música eletrônica. Além dessa honestidade com as referências que aprofundam-se nessa tendência explorada pelo artista, Adame continua aprimorando sua forma de composição de texturas de maneira muito bem definida, polida e dentro de uma certa lógica autoral. Isso demonstra um grande domínio na tessitura de cada uma das 4 faixas presentes no EP, repetindo a fórmula de sucesso já vista em “Conflito” e “Acidddd” em que se fazia soar muito com poucos elementos.
Este, para mim, é o grande diferencial do DJ como criador. Adame sabe melhor do que ninguém como utilizar as lacunas vazias dentro da música para parecer que existem vários elementos preenchendo esses espaços, quando na verdade tudo o que temos é a sua maneira sólida de composição ecoando em nossos ouvidos. Isso acontece também em “Techno 2”, uma faixa que inicia como um tradicional funk mandelão e que passa por momentos mais techno, transicionando no fim para o house, sob o uso de drums característicos muito bem adicionados entre essa e a próxima faixa do EP.
Neste ponto da experiência do ROLÊ de Adame (faixa 3), as coisas podem ficar um pouco dentro de apenas uma nota por um momento, no entanto, dentro do contexto do projeto – que busca se aproximar de um mini set do artista principal – é preciso de um momento de descanso, como em todo bom show de DJs como ele. Ainda assim, em “Movimento Na Favela”, existe uma busca por contrastes estéticos muito bem explorada que une o tuim com graves mixados de forma mais estourada, repetindo a sensação de preenchimento utilizando poucos elementos na construção musical.
O highlight do disco fica a cargo de “Pagode Do Adame”, uma faixa que continua utilizando o hardcore misturado com um beat ácido do techno, dando espaço até para o tamborzão do funk carioca e beat serie gold, justamente para relembrar que sim, por incrível que pareça, você está ouvindo um álbum de funk. Tal constatação representa a trajetória percorrida pelo gênero até aqui, uma vez que ele não soa mais da mesma forma como quando ficou popular no início dos anos 2000.
Nessa curta experiência, o artista segue descaracterizando o mandelão – e tudo que o termo guarda-chuva pode representar – mas continua mantendo a essência do gênero funk, sendo a decisão criativa mais interessante em seu trabalho. Adame não tenta recriar o funk através da música eletrônica, mas sim o contrário. Ao invés de ir em busca de drops previsíveis como um DJ regular de música house, ou então de uma repetição acelerada dos beats techno, o funkeiro utiliza elementos dos dois estilos na composição de sua própria combustão de ritmos, entregando um trabalho cuidadoso, polido e muito competente.
Pré-save: Spotify
Selo: Boysnoize Records
Formato: EP
Gênero: Funk / Eletrônica